05 novembro 2015

Há os que tremem com picas e os que fazem tremer quem pica

Se vieram enganados pelo título e estão a pensar que vou dissertar aqui sobre algum tema de natureza badalhoca (ai essas cabecinhas...), podem já parar de ler. Vá, não digam que não sou amiga.

Há pessoas que têm problemas com agulhas. Era o caso da senhora que chegou hoje, antes de mim, ao laboratório de análises clínicas. Já entradota na idade (shiu, eu sei que não vou para nova, mas aquela já me levava um bom avanço), toda ela tremia enquanto entregava a requisição. "Ai, sabe, isto já tem um ano, eu não gosto nada de tirar sangue, depois só me lembro quando preciso de ir à médica novamente". A voz a falhar, o papel a tremelicar nas mãos, a resignação enquanto a técnica dizia "tenha calma, não vale a pena estar assim, a senhora tem aqui umas veias que são uma maravilha, não custa nada... pronto, já está!" E lá saiu ela, branca como a cal da parede, quase muda, passito apressado na ânsia de fugir dali.

Entro eu. Calma e serena, respondo ao sorriso da técnica com o meu próprio. Conversa de circunstância, ela tão calma e profissional. Fiel à minha história, sento-me e arregaço as duas mangas, expondo os dois braços. O sorriso dá lugar a uma ligeira expressão de interrogação. Respondo calmamente "deixo-a escolher". E começa o mesmo baile de sempre. Coloca garrote num braço, apalpa, franze o sobrolho, tira garrote, coloca no outro braço, apalpa, franze ainda mais o sobrolho. Por esta hora o sorriso já vai a milhas e começa a notar-se um ligeiro tremor. "Estas veias...".

Sim, as minhas veias. Já lhes chamaram muita coisa. "Fios de cabelo" e "bailarinas". Engraçado, combinam com a dona. Já lhes fizeram muita coisa também. Já mas colapsaram. Já mas atravessaram de um lado ao outro. Já as perderam a meio da colheita, obrigando a várias reviravoltas com a agulha para as voltar a encontrar. Já me deixaram braços completamente negros. Já tremeram e suaram durante o procedimento. Já foram buscar agulhas pediátricas. Uma boa colheita, para mim, traduz-se em sair de lá sem hematomas e apenas com uma marca de picada, mesmo que acompanhada pela forte dor no braço, que nunca ninguém conseguiu evitar.

Gostava muito de ser dadora de sangue. Mesmo. Só que não tenho o peso mínimo exigido. Até pode ser que, um dia destes, com algum jeitinho (e uma feijoada na véspera), consiga enganar o pessoal. Tirando isso, a minha dúvida consiste apenas no tipo de ataques que vou provocar nos técnicos ou nas horas que demorará a encher um simples saquinho, já que "baixo débito" é outro dos mimos que usam para descrever o meu sistema venoso. Nome por nome, mimo por mimo, sempre prefiro que me digam que tenho veia (de) bailarina. É que esse, pelo menos, eu posso encarar como um elogio.

10 comentários:

  1. E eu a pensar que ía ler um post sobre os picas do metro :P

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    1. Tu?! Pensares em picas DO metro?? Se tivesses dito picas AO metro, eu ainda acreditava... :p

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  2. E eu que gosto de ver agulhas à distância, confirmei agora que sou uma sortuda do caraças!
    Não tremo como varas verdes perante uma pica, mas fiquei traumatizada em criança e nunca mais encarei as senhoras da pica com os mesmo olhos...vá de retro satanás!

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    1. Pois, gostar, gostar, acho que ninguém gosta... só aqueles com veia masoquista ;)

      (no meio disto tudo também me considero sortuda por nunca ter tido nenhum problema de saúde grave, que obrigasse a grandes colheitas ou canalização de veias!)

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  3. Antes também me incomodava muito ter de tirar sangue :) mas agora já não, graças a Deus :P

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    1. Imagino, esse lado também não deve ser nada fácil. Além da própria colheita poder ser complicada, ainda têm de lidar com a ansiedade dos doentes também :)

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  4. É o que dá pertencer à realeza, rsss. São as chamadas "veias de sangue-azul", são finas! :D
    Ou então tens veia "artística" - além de bailarina, são elusionistas. Ahha.
    Tb me dizem que as tenho finas. Mas num certo braço lá as apanham sempre.

    Isto tudo só me faz interrogar sobre algo que desconheço: em caso de acidente e de estar a esvazar o sangue, vai ser difícil dar com a fuga ou apanhar as malandras, presumo.

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    1. Ahaha, se calhar é isso, têm a mania que são reais, quando a dona é 100% plebeia! ;)

      Nunca tinha pensado nisso, mas se for só um furinho, e com a minha pressão de passarinho, não sai nada que se veja :)

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  5. Ai ai que já quase desmaiei, só de "visualizar". Eu quase como a senhora que entrou antes, a diferença é não adio a data! Não olho (nem nas vacinas)!

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    1. Medos ou receios todos temos, o importante é o que fazemos com eles. O facto de não adiares só prova que enfrentas os teus, e isso chama-se coragem :)

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